sexta-feira, 23 de abril de 2010

Arrogância pouca é bobagem!


Nada mais me surpreende nessa vida! Agora a Associação dos Magistrados Brasileiros (os moradores do Olimpo) querem atribuir aos advogados a letargia da justiça brasileira, propondo que os advogados sejam multados, isso mesmo, MULTADOS, se provocarem retardamentos nos processos em que atue. Pois bem, a advocacia já vem sendo vilipendiada pelos outros operadores do Direito há muito, e agora surgem estes com mais esta "fabulosa" idéia! Até acho que tal penalidade poderia se aplicar, porém, não antes de serem exemplarmente punidos os magistrados que sentam em processos por anos e mais anos, deixando o advogado e o jurisdicionado reféns das "nádegas da justiça"! Esqueceram-se os filhotes de Deus que o advogado possui prazos peremptórios! Não se manifestando adequadamente e DENTRO DO PRAZO LEGAL o advogado se prejudica e prejudica seu cliente! Em síntese, a AMB está sentando sobre seu longo e peludo rabo para alegar que a justiça rasteja lentamente por conta dos "astutos" advogados que retardam os processos! Passo a crer que tal sinal de arrogância é mais uma prova inequívoca que os homens de "capa preta" de fato pensam serem deuses! Quando os magistrados forem punidos por não trabalharem como deveriam, quando eles TAMBÉM cumprirem os prazos entabulados na Lei, quando fizerem por merecer o digníssimo salário que recebem, talvez se credenciem a apondar seus longos dedos para os advogados, estes sim, abnegados e sofridos operadores do Direito e da JUSTIÇA!

terça-feira, 6 de abril de 2010

Formados em Solidão

O tempo passou e me formei em solidão


Sou do tempo em que ainda se faziam visitas. Lembro-me de minha mãe mandando a gente caprichar no banho porque a família toda iria visitar algum conhecido. Íamos todos juntos, família grande, todo mundo a pé. Geralmente, à noite. Ninguém avisava nada, o costume era chegar de pára-quedas mesmo. E os donos da casa recebiam alegres as visitas. Aos poucos, os moradores iam se apresentando, um por um.


– Olha o compadre aqui, garoto! Cumprimenta a comadre. E o garoto apertava a mão do meu pai, da minha mãe, a minha mão e a mão dos meus irmãos. Aí chegava outro menino. Repetia-se toda a diplomacia.


– Mas vamos nos assentar, gente. Que surpresa agradável! A conversa rolava solta na sala. Meu pai conversando com o compadre e minha mãe de papo com a comadre. Eu e meus irmãos ficávamos assentados todos num mesmo sofá, entreolhando-nos e olhando a casa do tal compadre. Retratos na parede, flores na mesinha de centro… casa singela e acolhedora.


A nossa também era assim. Também eram assim as visitas, singelas e acolhedoras. Tão acolhedoras que era também costume servir um bom café aos visitantes. Como um anjo benfazejo, surgia alguém lá da cozinha – geralmente uma das filhas – e dizia: – Gente, vem aqui pra dentro que o café está na mesa. Tratava-se de uma metonímia gastronômica. O café era apenas uma parte: pães, bolo, broas, queijo fresco, manteiga, biscoitos, leite… tudo sobre a mesa. Juntava todo mundo e as piadas pipocavam. As gargalhadas também. Pra que televisão? Pra que rua? Pra que droga? A vida estava ali, no riso, no café, na conversa, no abraço, na esperança… Era a vida respingando eternidade nos momentos que acabam…. era a vida transbordando simplicidade, alegria e amizade…


Quando saíamos, os donos da casa ficavam à porta até que virássemos a esquina. Ainda nos acenávamos. E voltávamos para casa, caminhada muitas vezes longa, sem carro, mas com o coração aquecido pela ternura e pela acolhida. Era assim também lá em casa. Recebíamos as visitas com o coração em festa.. A mesma alegria se repetia. Quando iam embora, também ficávamos, a família toda, à porta. Olhávamos, olhávamos… até que sumissem no horizonte da noite.


O tempo passou e me formei em solidão. Tive bons professores: televisão, vídeo, DVD, e-mail… Cada um na sua e ninguém na de ninguém. Não se recebe mais em casa. Agora a gente combina encontros com os amigos fora de casa: – Vamos marcar uma saída!..– ninguém quer entrar mais.


Assim, as casas vão se transformando em túmulos sem epitáfios, que escondem mortos anônimos e possibilidades enterradas. Cemitério urbano, onde perambulam zumbis e fantasmas mais assustados que assustadores. Casas trancadas. Pra que abrir? O ladrão pode entrar e roubar a lembrança do café, dos pães, do bolo, das broas, do queijo fresco, da manteiga, dos biscoitos do leite…Que saudade do compadre e da comadre!


José Antonio Oliveira de Resende


Professor de Prática de Ensino, do Departamento de Letras, Artes e Cultura,


da Universidade Federal de São João Del Rei